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O dia em que percebi que não precisava usar roupa social no trabalho

A importância de mostrar a cultura dentro da empresa para seus novos colaboradores

Lembro claramente da minha entrevista de emprego em determinada empresa. Eu tinha me candidatado à vaga, feito algumas entrevistas e um belo dia recebi a ligação do RH querendo marcar uma hora para eu falar com a gerente. Era a entrevista final.

O problema é que tinha que ser naquela mesma tarde, eu estava na rua, nem um pouco pronto para uma entrevista. Usava tênis Allstar, jeans e uma camiseta preta velha. Vale ressaltar que naquele tempo eu só atendia a entrevistas com, pelo menos, uma camisa social, pagando de sério.

Resolvi ir de qualquer maneira, afinal o não tinha muita opção. O mês estava acabando e a janela de contratação da empresa iria fechar em alguns dias. Era preciso fazer a entrevista e lidar com todos os documentos a tempo.

Deu tudo certo e fui contratado. Independente da roupa que estava usando.

No dia da entrevista eu não pude deixar de notar que todos os funcionários que encontrei no caminho para a sala da gerente usavam roupas sociais. Aparentava ser uma regra de vestimenta da empresa, ou pelo menos do meu setor. Um Dress Code.

No primeiro dia, me vesti “adequadamente” e me apresentei ao trabalho. Camisa, calça e sapato social. E segui dessa maneira pelos próximos dias, até a primeira sexta-feira.

Neste dia eu era o único de roupa social, pois todos os outros funcionários vestiam camisa polo, jeans e sapatênis… Aparentemente, às sextas-feiras, o meu setor tinha um modelo de Casual Friday.

Aparentemente. Uma palavra que utilizei bastante até agora, não é?

A verdade é que não havia regra. Em nenhum momento chegou ao meu conhecimento a informação de que existia um Dress Code na empresa ou até mesmo no setor. Como uma boiada, todos seguiam na direção do que, aparentemente, era uma regra definida, mas ninguém sequer tentou verificar se essa regra existia mesmo.

A sistema de boiada era tão intenso, que até o Casual Friday acabou virando a Polo-sapatênis Friday. Até nesse dia, que deveria ser mais livre, todos seguiam o mesmo estilo de vestimenta rigorosamente.

É claro que existe um motivo para tudo isso. Essa era uma grande empresa, com nível multinacional e com diversos cargos altos e setores comerciais que provavelmente exigiam essa formalidade. Então era muito mais seguro para todos os outros funcionários que seguissem a mesma regra, talvez por medo ou qualquer outro motivo. Mas eu não via relação disso tudo com o setor em que trabalhava…

Então, na segunda ou terceira semana de trabalho, eu enchi o saco de usar social e resolvi tentar uma coisa diferente. Fui trabalhar vestido casualmente, com meu tênis, jeans e camiseta, para ver o que aconteceria. Afinal de contas, eu estava assim no dia da minha entrevista e não houve problema nenhum com aquela gerente, que agora era minha superiora direta.

Imagine a minha surpresa quando ninguém pareceu sentir a diferença na minha vestimenta. Tudo ocorreu exatamente como sempre. Nenhum comentário, nenhuma olhada torta… E assim continuou sendo até o dia em que deixei a empresa.

Vale comentar que eu continuei sendo o único a me vestir casualmente no meu setor durante todo o tempo em que fiquei lá. Então não causei nenhuma mudança de cultura, disruptura, nem nada do tipo. Todos continuaram a seguir o Dress Code inexistente do setor.

Ah, depois de deixar a empresa eu precisei ir no setor de RH para assinar alguns documentos e descobri que existia um Dress Code sim. Não podia entrar na empresa usando bermudas. De qualquer forma, isso só foi me dito pelo segurança da recepção depois que eu já estava saindo do prédio… de bermudas.

Um problema com a vestimenta parece meio bobo para dar tanta atenção, mas serve como um exemplo de cultura dentro de uma empresa. E ela é algo que afeta diretamente todas as pessoas que trabalham no ambiente.

O que eu concluí de tudo isso é que é muito importante que a cultura seja muito bem ensinada (ou passada) para os novos colaboradores.

Como não existia nada que me mostrasse que eu tinha que usar um tipo de roupa para ir trabalhar eu resolvi me sentir livre para usar o que eu bem entendesse. Se não existem regras, cada um acaba criando suas próprias.

Quanto maior a empresa, mais difícil é para seus dirigentes manter uma cultura bem definida. Isso é compreensível. Em empresas pequenas, manter a cultura é muito mais fácil, mas nem sempre simples. Imagine em gigantes.

Nesse caso simples de vestimenta, por exemplo, um pequeno email de boas-vindas descrevendo algumas “boas práticas” no setor poderia ter resolvido o problema e eu não teria feito tanto caso com algo tão simples.

Publicado originalmente no Medium.

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Como não empreender

Quando deixei o emprego para empreender… e deu bem errado

Era final de 2014. Já havia um tempo que eu estava confortável em um bom emprego. Apesar de ter adquirido algumas dívidas nos últimos meses e o salário não ser lá essas coisas, eu conseguia dar conta das necessidades do mês. Vivendo mês a mês.

Foi então que surgiu uma oportunidade de mudar de empresa. Era um trabalho “melhor”, para ganhar mais e em uma multinacional.

A saída da antiga empresa me rendeu uma boa grana. Com ela resolvi boa parte dos problemas financeiros que havia adquirido e ainda consegui guardar um pouco na poupança.

Era a famosa época das vacas gordas. Conseguia dar presentes caros e jantar em lugares chiques.

Eu tinha um salário bom e dinheiro guardado. O sonho da classe média.

Até aí tudo ótimo, não é? Na verdade não.

O novo trabalho era uma tortura para mim. Não tinha nada do que eu gostava na minha profissão. Além disso, era cheio de burocracias burras e desnecessárias que só faziam cair, e muito, a produtividade. O ambiente parecia tirado de um galpão de operações da CIA, ou qualquer agência norte-americana, daqueles filmes dos anos oitenta.

Foram apenas quatro meses até que eu não aguentasse mais. Pedi demissão.

Com dinheiro na poupança e sem as dívidas era a hora de fazer algo por mim.

Eu poderia ter conhecido um lugar diferente, visitado a família, comprado algo legal, ou qualquer outra coisa de consumo rápido. Depois era só voltar a procurar um emprego e seguir a vida. Mas eu decidi fazer algo diferente.

Já fazia um bom tempo que eu estava namorando a ideia de empreender. Ter meu próprio negócio, minha própria empresa.

Há algum tempo eu acompanhava os vídeos dos “gurus” do empreendedorismo da época e estava louco para experimentar aquela sensação de liberdade que eles tanto falavam e passavam a seus seguidores.

Antes mesmo de sair da empresa que citei lá no começo deste texto, eu já tinha começado a desenvolver um software on-line para pequenos negócios. Esse seria meu primeiro produto.

Tinha certeza de que era uma ótima ideia e que poderia ser vendido como SaaS (Software as a Service) por uma mensalidade pequena, que os micro e pequenos empresários pudessem pagar. Bastaria eu manter as melhorias contínuas no sistema e todo o pequeno negócio ia querer usar minha ferramenta.

Como uma criança inocente mostrando seu rabisco em giz de cera para a sua mãe, eu mostrei meu produto para pessoas próximas e só recebi feedbacks positivos. “A ideia é boa”, “vai dar certo”.

Ok. Eu tinha um produto e uma grana guardada. Era hora de começar a empreender.

Então corri atrás dos primeiros usuários para testar a ferramenta de forma gratuita. Até consegui um ou outro. Eles se cadastraram no meu software e eu comecei a ficar empolgado.

Nesse mesmo período eu encontrei pela primeira vez os meus concorrentes.

Sim, eu não conhecia meus concorrentes ainda. Errei feio, errei rude.

Comecei a ficar desanimado com a ideia e meu primeiro produto já estava caindo no esquecimento. Tanto dos seus primeiros usuários, que logaram apenas uma vez no sistema e nunca mais voltaram, como de mim mesmo, que não via mais esperança de que meu MVP pudesse ter algum futuro.

Meu produto não tinha nenhum diferencial atrativo para os clientes. Ele não fazia nada que os outros já não fizessem. E o que fazia de igual, fazia pior.

Nesse meio tempo o dinheiro começou a ficar escasso. A poupança estava secando…

Nesse momento resolvi mudar a “empresa” para uma prestadora de serviços. Era hora de tentar vender minhas habilidades de desenvolvimento de sites e sistemas personalizados para os micro e pequenos negócios.

Meu novo plano parecia perfeito, vendia um site ou um sistema por um valor que o pequeno empreendedor pudesse pagar e cobrava uma mensalidade, também barata, para manter o serviço hospedado e funcionando.

Na verdade eu era um freelancer, mas a ideia ser um empreendedor fazia tudo parecer mais importante do que realmente era.

Apenas uma questão de aparência.

Eu continuava indo nas reuniões e eventos com meu terno surrado e sapato velho, para me sentir um empresário. Talvez se tivesse apenas admitido que era um freelancer, as coisas teriam sido muito mais fáceis.

Graças ao network que vinha construindo há um tempo, consegui fazer alguns contatos e cheguei a fazer um sistema e alguns sites.

Depois de um tempo focado em vender essa nova ideia “genial” de serviços por mensalidade, as coisas não chegaram nem perto de melhorar na minha vida financeira. As dívidas continuavam aumentando.

A matemática era muito simples: eu não sabia vender e muito menos precificar o meu trabalho do jeito certo.

Eu vendia um serviço que valia muito, mas cobrava pouco pelo mesmo, com medo de que os clientes não quisessem me contratar.

Para piorar, alguns clientes começaram a dar calote. Não importa se você tem um contrato com algumas pessoas, elas simplesmente não vão pagá-lo.

Nessa época eu comecei a ficar depressivo.

Eu passava todos os dias em casa, com pouco trabalho a fazer. Minha esperança de melhorar a vida estava se esvaindo cada vez mais. Eu só queria deitar na minha cama a tarde toda e dormir para esquecer o buraco em que eu tinha me colocado.

Então… a fonte secou de vez. Minha poupança estava vazia. Zerada.

Para comprar comida e pagar as contas de água e luz e o aluguel, comecei a usar todo o crédito que podia no banco. Até o dia em que essa fonte também secou. O banco agora queria que eu começasse a devolver tudo. Com juros, é claro… muitos juros.

Finalmente, muito mais tarde do que deveria, eu me dei conta de que a situação tinha atingido um nível que eu jamais imaginei que pudesse atingir.

“Eu falhei. Cheguei ao fundo do poço.”

Esse era o único pensamento que passava pela minha cabeça. A derrota estava completa.

Foi então que, com ajuda e conselhos de amigos, resolvi tomar uma atitude. Assumir as falhas cometidas, perceber que não tinha mais condições de continuar naquela jornada e procurar um trabalho com salário fixo. Era a solução mais rápida que poderia me ajudar a tapar os buracos financeiros aos quais eu havia me enfiado.

Era hora de encerrar a minha primeira jornada de empreendedor. Talvez não para sempre, mas até uma nova oportunidade. E quando ela vier, estarei mais pronto e com muito mais experiência.

Foram muitos os erros cometidos em menos de um ano após começar a empreender. Uma sequência de falhas. Uma mistura de despreparo com falta de planejamento e excesso de confiança.

Apesar de ter passado por uma fase terrível da minha vida, hoje eu percebo o quanto tudo o que aconteceu foi importante para mim. O quanto consegui aprender com esses erros e, principalmente, o quanto isso foi importante para que eu me conhecesse melhor como pessoa e como profissional.

“É bom celebrar o sucesso, mas é mais importante prestar atenção nas lições do fracasso.”

Onde foi que eu errei? Para tentar resumir toda essa história em algo produtivo, resolvi listar quais foram os erros que pude identificar nessa curta jornada de empreendedor.

Então, para encerrar, vamos para o jogo dos sete erros.

1. Excesso de autoconfiança, despreparo e falta de planejamento. Um desconhecimento total do mercado e dos concorrentes que atuavam nele.

2. Se apaixonar por uma ideia sem pensar no que ela traria de diferente para suprir a “dor” do cliente. A paixão cega.

3. Acreditar que poderia ter um negócio que atingiria o breakeven point em apenas alguns meses. Onde as contas da empresa (e minhas) seriam pagas pelo próprio faturamento da empresa.

4. Não fazer uma conta simples: por quanto tempo consigo sobreviver com esse dinheiro que tenho guardado?

5. Sentir-se derrotado, desanimar e não persistir logo nos primeiros nãos. Uma falha grave para qualquer um que está começando qualquer coisa.

6. Ser orgulhoso demais para entender que falhou. Se você não admite o erro, como pode tomar uma atitude para consertá-lo?

7. Seguir gurus da internet. Alguns podem ajudar muito, mas a maioria tem conteúdo muito superficial e de autoajuda, algo que não vai auxiliar em nada quando você estiver precisando de conselhos mais “práticos”.

Esses itens são apenas alguns dos centenas de aprendizados que tive durante esse curto espaço de tempo. Mas resumem bem o que não fazer quando se quer empreender.

Apesar de aprendermos muito mais com nossos próprios erros do que com os erros dos outros, acredito que essa minha experiência possa servir para que outras pessoas entendam um pouco mais sobre essa perigosa aventura chamada empreendedorismo.

Publicado originalmente no Medium.